Há cerca de 7 mil anos, o Deserto do Saara era um lago repleto de micro-organismos e algas. Quando esse lago secou, a areia rica em nutrientes – especialmente em fósforo – remanesceu e se tornou o que hoje conhecemos como o Saara.  A Floresta Amazônica – por sua vez – é um ecossistema crucial para a regulação do clima da Terra, representando cerca da metade das florestas tropicais remanescentes no planeta. Alterações na cobertura florestal e produtividade podem ter consequências significativas no ciclo do carbono, nas circulações atmosféricas, no ciclo hidrológico e no clima em escalas regionais e globais.

A distância geográfica entre o Deserto do Saara e a Floresta Amazônica é de mais de 5 mil quilômetros, mas a relação entre esses dois biomas é surpreendente e essencial para manter a biodiversidade na maior floresta tropical do mundo: estudo da NASA (Administração Nacional da Aeronáutica e Espaço – agência do governo federal dos Estados Unidos responsável pela pesquisa e desenvolvimento de tecnologias e programas de exploração espacial)  revelou que mais de 27 milhões de toneladas de areia e cerca de 22 mil toneladas de fósforo viajam do Saara para a Amazônia todos os anos. Além disso, os pesquisadores mediram a formação química das substâncias na atmosfera da Amazônia, utilizando um instrumento óptico chamado Lidar, que demonstrou a presença de elementos como alumínio, manganês, ferro e silício na poeira encontrada no local, todos em proporções semelhantes aos encontrados na poeira do Saara.

Supreendentemente, os dados desta pesquisa comprovam que o deserto é um importante provedor de nutrientes para a região sul-americana e responsável por grande parte das chuvas torrenciais que caem na Amazônia.

Conforme publicações da NASA através do Centro de Pesquisa Goddard Space Flight Center, a produtividade a longo prazo da floresta amazônica pode depender em grande parte da deposição atmosférica de poeira, que pode vir de um ecossistema distante, como o deserto do Saara. A presença de poeira africana na Bacia Amazônica tem sido observada há quase duas décadas, mas a quantidade de poeira e fósforo associado ainda não é bem compreendida. Parte dessa areia é carregada pelo vento durante as gigantescas tempestades de areia que atingem a região do Chade, na África do Norte, e é levada por quase 5 mil quilômetros até a América do Sul. Essa pesquisa foi realizada através das Observações de Satélite denominado CALIOP. Desde junho de 2006, o CALIOP tem medido distribuições 3D de retro espalhamento, extinção e relação de despolarização de aerossóis atmosféricos (partículas finíssimas que são encontradas suspensas no ar) de céu claro e acima das nuvens em escala global. Estas observações avançadas de satélite são ideais para quantificar o transporte intercontinental e a deposição de aerossóis, especialmente na região amazônica.

Após quase duas décadas de estudos, sabe-se que a quantidade de Fósforo, nutrientes e silício encontrados nas partículas coletadas na Amazônia é a mesma que é encontrada na poeira do Saara. Além disso, há correlação entre a presença desses aerossóis e o movimento das massas de ar. O próximo passo da pesquisa é entender a extensão temporal desse processo e prever até quando o Saara poderá continuar fertilizando a Amazônia.

 

Essa relação entre o Deserto do Saara e a Floresta Amazônica destaca a complexidade e a importância dos ecossistemas globais e nos lembra da interconexão surpreendente e essencial entre diferentes regiões do mundo: o deserto também é responsável por trazer chuvas torrenciais para a região, através do fenômeno conhecido como “rios voadores”. Esses rios são massas de ar carregadas de vapor de água que se deslocam da Amazônia em direção a outras regiões do continente, levando a umidade e as chuvas para esses locais. No caso da floresta amazônica, uma parcela desses aerossóis atmosféricos que funcionam como núcleo de condensação de água da chuva é proveniente do Saara.

Além disso, a poeira do Saara também pode afetar a qualidade do ar na região amazônica. A presença de partículas de areia na atmosfera pode contribuir para a formação de nuvens, mas em excesso pode prejudicar a saúde das pessoas e dos ecossistemas locais, sendo um elemento importante para manter o equilíbrio ecológico da região. É essencial que se continue estudando e monitorando esse fenômeno para garantir a preservação da biodiversidade da Amazônia.

 

A Influência do Saara no Clima ao Redor do Globo

 

Além da contribuição de nutrientes e da influência nos rios voadores e na qualidade do ar na Amazônia, a poeira do Saara também pode afetar o clima global.

Esse mesmo estudo publicado pela NASA mostra que a poeira desértica pode afetar a formação de nuvens e a temperatura em diferentes regiões do mundo. Quando a poeira é transportada pelo ar, ela pode interagir com a radiação solar, afetando a temperatura da superfície terrestre e da atmosfera. Além disso, o fenômeno influencia quantidade de precipitação em diferentes regiões, o que pode ter impactos significativos na agricultura, na disponibilidade de água e na biodiversidade.

Um outro levantamento publicado na revista Nature Communications mostrou que o movimento de partículas provenientes do Saara pode afetar a quantidade de chuvas na África Oriental e na Península Arábica, contribuindo com a formação de nuvens de tempestade, diminuindo a quantidade de chuva em algumas áreas e aumentando em outras.

Colaborando com a mesma linha de pesquisa, um outro estudo publicado na revista Science mostrou que a poeira do Saara pode afetar a quantidade de neve que cai nas montanhas do Colorado, nos Estados Unidos. O levantamento o Saara influencia na refletividade da neve, fazendo com que ela derreta mais rapidamente, o que pode afetar o abastecimento de água em algumas regiões.

Portanto, a poeira do Saara é um elemento importante para entendermos os impactos das mudanças climáticas em diferentes regiões do mundo, e a sua contribuição para a Amazônia é apenas uma parte de um fenômeno muito mais amplo e complexo. Ao contrário do que muitos acreditam, a preservação do Saara é de extrema importância para o mundo. Esse vasto deserto exerce uma influência significativa no clima global e é um importante regulador do clima da Terra. Através do processo de refletividade, o Saara ajuda a refletir os raios solares de volta ao espaço, o que ajuda a manter a temperatura global em um nível tolerável. Além disso, as mudanças na vegetação e na cobertura de areia podem afetar a intensidade e a frequência de eventos climáticos extremos, como tempestades de poeira, furacões e secas prolongadas em diversos locais do mundo, o que torna crucial que ações sejam pensadas para preservar o Saara e proteger sua biodiversidade, contribuindo consequentemente com a mitigação dos impactos das mudanças climáticas e para garantir um futuro sustentável para todos.

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